segunda-feira, 25 de junho de 2012


Sistemas Educativos/ Organização e Avaliação

Ficha de leitura/Resumo

Fernandes, Domingos, Limitações e Potencialidades da Avaliação Educacional, Prefácio.

Nunca como agora foram tantas as pressões para que, nos mais variados contextos educativos e formativos, se avalie tudo e todos. Entramos numa era em que a “prestação de contas” é uma prioridade.
A presença crescente da avaliação nas mais variadas áreas da vida social é hoje uma realidade indispensável e mesmo insubstituível.
Daqui e dali surgem instrumentos prontos a usar para avaliar professores, escolas e sistemas educativos. Tudo em nome da qualidade, eficiência e eficácia que em rigor, nem sempre serão discutidas com clareza e com a desejável e necessária profundidade. Há uma corrida à avaliação como se ela fosse a panacéia para todos os males que apoquentam os sistemas educativos.
Em poucos anos, multiplicaram-se as avaliações no seio dos sistemas educativos: das aprendizagens dos alunos, dos desempenhos dos professores e das escolas, dos programas lançados pelas administrações educativas ou dos currículos.
 Diferentes organizações internacionais, governamentais e não-governamentais, têm promovido estudos de avaliação das aprendizagens, sobretudo em Matemática, Ciências e Língua Materna, envolvendo dezenas de países, milhares de escolas e dezenas de milhares de estudantes. Entre estas avaliações, encontra-se o Programme for International Student Assessment (PISA), da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) e o Third International Mathematics and Science Study (TIMSS) da International Association for the Evaluation of Educational Achievement (IEA).
A chamada globalização e a consequente interdependência econômica de muitos países, não são indiferentes a estes esforços avaliativos que, acabam por influenciar o desenvolvimento das suas políticas educativas.
No domínio das aprendizagens dos alunos, parece ser claro que os esforços de avaliação têm estado mais centrados nas avaliações externas – exames nacionais – da responsabilidade dos Ministérios da Educação e menos nas respectivas avaliações internas, da responsabilidade dos professores e das escolas. Ou seja, há um déficit de investimento na chamada avaliação pedagógica, na avaliação cujo principal propósito é o de ajudar alunos e professores a aprender e a ensinar melhor e que ocorre no interior das salas de aula.
A avaliação pode ajudar-nos a construir escolas mais inteligentes, com projetos pedagógicos capazes de apoiar a emancipação dos jovens estudantes e dos próprios professores pois contribuem de forma inequívoca para que se aprenda a ensinar e para que se aprenda a aprender. A banalização da avaliação pode conduzir-nos a um mero procedimento de controlo burocrático-administrativo, em vez de um poderoso processo de regulação e de melhoria, que exige a mobilização de processos cognitivos e metacognitivos complexos. No caso da aprendizagem dos alunos a avaliação deveria ser um processo eminentemente pedagógico, centrado em objetivos de largo alcance e de largo espectro, contínuo, fortemente participado e de grande exigência cognitiva. Deveria prevalecer uma avaliação de natureza essencialmente formativa, consistindo na recolha de informação e/ou de evidências de aprendizagem que, através de feedback apropriado, seria devolvida aos alunos para que eles pudessem, quando necessário, vencer as dificuldades.
A investigação realizada nas últimas décadas, particularmente a partir dos anos 80 do século passado, evidência de forma clara que a avaliação formativa melhora significativamente as aprendizagens dos alunos e, muito particularmente, dos que têm mais dificuldades.
A avaliação formativa está associada a processos significativos de desenvolvimento profissional dos professores, a melhorias sensíveis na organização e no funcionamento pedagógico das escolas e a formas diferenciadas de construção da sua autonomia. Importa acrescentar que a avaliação formativa, independentemente do ente que está a ser avaliado, está intrinsecamente associada a processos de autoavaliação, de autocontrolo e de autorregulação.
As práticas de avaliação formativa não podem deixar de implicar o exercício de práticas diferenciadas de autonomia, que exigem novas e inovadoras formas de desenvolvimento curricular, de participação dos professores no seu próprio desenvolvimento profissional ou de organização e de funcionamento dos grupos que constituem a escola.
A avaliação tem um importante papel a desempenhar nos sistemas educativos e na sociedade em geral, mas é necessário que exista o discernimento suficiente para que se perceba que papel é esse e quais são os seus limites. Para que não seja vista como mais uma técnica que se utiliza de forma mecânica e burocrática e permitir que a avaliação e os avaliadores se tornem numa espécie de juízes, acima de qualquer suspeita, acima de qualquer escrutínio, que dizem a todos o que está funcionando bem e o que está funcionando mal…
A avaliação permite caracterizar, compreender, divulgar e ajudar a resolver uma grande variedade de problemas que afeta a sociedade contemporânea, tais como o pleno acesso à educação, a prestação de cuidados de saúde, a distribuição de recursos e a pobreza. Melhorar a vida e o bem-estar das pessoas é contribuir para a construção de justiça a todos os níveis e para a implantação de sistemas sociais e políticos plenamente democráticos, é um dos mais prementes desafios às teorias, às práticas e às políticas de avaliação.
Pensando no contexto de muitos sistemas educativos contemporâneos, questionar um status quo pedagógico em que se continua a discriminar e a segregar socialmente milhões de alunos um pouco por todo o mundo, é um imperativo ético e político da maior relevância que tem de ser assumido por todos: professores, educadores, investigadores, políticos, pais e encarregados de educação e alunos. Trata-se de um problema de graves repercussões que a avaliação pode e deve ajudar a resolver através de:
a) novas formas de avaliar o que os alunos sabem e são capazes de fazer;
b) sistemas que permitam avaliar o desempenho de educadores e professores, apoiando-os no seu desenvolvimento profissional;
c) processos amplamente participados de autoavaliação das escolas e das instituições escolares em geral.
Conscientes das limitações e dos perigos de olharmos para a avaliação de forma pouco crítica, podemos transformá-la numa importante alavanca de transformação e de melhoria das realidades educativas. Realmente, a avaliação pode, por exemplo, contribuir para que se rompa com o paradigma da transmissão do conhecimento e se desenvolva um paradigma em que o conhecimento é construído interactivamente ou que o ensino uniforme dê lugar a um ensino diferenciado que responda às necessidades de todos e de cada um dos jovens estudantes.
Da mesma maneira, a avaliação pode ser um processo clarificador e de tomada de consciência coletiva dos professores e das escolas quanto ao desempenho dos sistemas educativos.
A avaliação, por definição e natureza, potencializa a valorização e a credibilidade das competências profissionais, científicas e pedagógicas dos professores. Neste sentido, poderá ser um importante processo de regulação, de amadurecimento, de credibilidade e de reconhecimento de uma classe profissional que, numa diversidade de países, está confrontada com um dos desafios mais significativos dos últimos anos.
Quaisquer que sejam os desenvolvimentos das políticas educativas para os próximos anos, poderá ser grave não atribuir uma prioridade clara à melhoria do ensino, das aprendizagens e da organização e funcionamento pedagógico das escolas, através de sistemas de avaliação de natureza marcadamente formativa.
Desta forma, a partir de uma multiplicidade de perspectivas e de diferentes contextos de aplicação prática da avaliação, ficam bem claras as suas reais potencialidades para transformar e melhorar as realidades dos sistemas educativos contemporâneos.

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