Sistemas
Educativos/ Organização e Avaliação
Ficha de leitura/Resumo
Fernandes, Domingos, Limitações e Potencialidades da
Avaliação Educacional, Prefácio.
Nunca
como agora foram tantas as pressões para que, nos mais variados contextos
educativos e formativos, se avalie tudo e todos. Entramos numa era em que a
“prestação de contas” é uma prioridade.
A
presença crescente da avaliação nas mais variadas áreas da vida social é hoje
uma realidade indispensável e mesmo insubstituível.
Daqui
e dali surgem instrumentos prontos a usar para avaliar professores, escolas e
sistemas educativos. Tudo em nome da qualidade, eficiência e eficácia que em
rigor, nem sempre serão discutidas com clareza e com a desejável e necessária
profundidade. Há uma corrida à avaliação como se ela fosse a panacéia para
todos os males que apoquentam os sistemas educativos.
Em
poucos anos, multiplicaram-se as avaliações no seio dos sistemas educativos:
das aprendizagens dos alunos, dos desempenhos dos professores e das escolas,
dos programas lançados pelas administrações educativas ou dos currículos.
Diferentes organizações internacionais,
governamentais e não-governamentais, têm promovido estudos de avaliação das
aprendizagens, sobretudo em Matemática, Ciências e Língua Materna, envolvendo
dezenas de países, milhares de escolas e dezenas de milhares de estudantes.
Entre estas avaliações, encontra-se o Programme for International Student
Assessment (PISA), da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Económico (OCDE) e o Third International Mathematics and Science Study (TIMSS)
da International Association for the Evaluation of Educational Achievement
(IEA).
A
chamada globalização e a consequente interdependência econômica de muitos
países, não são indiferentes a estes esforços avaliativos que, acabam por influenciar
o desenvolvimento das suas políticas educativas.
No
domínio das aprendizagens dos alunos, parece ser claro que os esforços de
avaliação têm estado mais centrados nas avaliações externas – exames nacionais
– da responsabilidade dos Ministérios da Educação e menos nas respectivas avaliações
internas, da responsabilidade dos professores e das escolas. Ou seja, há um
déficit de investimento na chamada avaliação pedagógica, na avaliação cujo
principal propósito é o de ajudar alunos e professores a aprender e a ensinar melhor
e que ocorre no interior das salas de aula.
A
avaliação pode ajudar-nos a construir escolas mais inteligentes, com projetos
pedagógicos capazes de apoiar a emancipação dos jovens estudantes e dos
próprios professores pois contribuem de forma inequívoca para que se aprenda a
ensinar e para que se aprenda a aprender. A banalização da avaliação pode conduzir-nos
a um mero procedimento de controlo burocrático-administrativo, em vez de um
poderoso processo de regulação e de melhoria, que exige a mobilização de
processos cognitivos e metacognitivos complexos. No caso da aprendizagem dos
alunos a avaliação deveria ser um processo eminentemente pedagógico, centrado
em objetivos de largo alcance e de largo espectro, contínuo, fortemente
participado e de grande exigência cognitiva. Deveria prevalecer uma avaliação
de natureza essencialmente formativa, consistindo na recolha de informação e/ou
de evidências de aprendizagem que, através de feedback apropriado, seria
devolvida aos alunos para que eles pudessem, quando necessário, vencer as
dificuldades.
A
investigação realizada nas últimas décadas, particularmente a partir dos anos
80 do século passado, evidência de forma clara que a avaliação formativa melhora
significativamente as aprendizagens dos alunos e, muito particularmente, dos
que têm mais dificuldades.
A
avaliação formativa está associada a processos significativos de
desenvolvimento profissional dos professores, a melhorias sensíveis na
organização e no funcionamento pedagógico das escolas e a formas diferenciadas
de construção da sua autonomia. Importa acrescentar que a avaliação formativa, independentemente
do ente que está a ser
avaliado, está intrinsecamente associada a processos de autoavaliação, de autocontrolo
e de autorregulação.
As
práticas de avaliação formativa não podem deixar de implicar o exercício de
práticas diferenciadas de autonomia, que exigem novas e inovadoras formas de
desenvolvimento curricular, de participação dos professores no seu próprio desenvolvimento
profissional ou de organização e de funcionamento dos grupos que constituem a
escola.
A
avaliação tem um importante papel a desempenhar nos sistemas educativos e na
sociedade em geral, mas é necessário que exista o discernimento suficiente para
que se perceba que papel é esse e quais são os seus limites. Para que não seja
vista como mais uma técnica que se utiliza de forma mecânica e burocrática e permitir
que a avaliação e os avaliadores se tornem numa espécie de juízes, acima de
qualquer suspeita, acima de qualquer escrutínio, que dizem a todos o que está
funcionando bem e o que está funcionando mal…
A
avaliação permite caracterizar, compreender, divulgar e ajudar a resolver uma
grande variedade de problemas que afeta a sociedade contemporânea, tais como o
pleno acesso à educação, a prestação de cuidados de saúde, a distribuição de
recursos e a pobreza. Melhorar a vida e o bem-estar das pessoas é contribuir
para a construção de justiça a todos os níveis e para a implantação de sistemas
sociais e políticos plenamente democráticos, é um dos mais prementes desafios
às teorias, às práticas e às políticas de avaliação.
Pensando
no contexto de muitos sistemas educativos contemporâneos, questionar um status
quo pedagógico em que se continua a discriminar e a segregar socialmente
milhões de alunos um pouco por todo o mundo, é um imperativo ético e político
da maior relevância que tem de ser assumido por todos: professores, educadores,
investigadores, políticos, pais e encarregados de educação e alunos. Trata-se
de um problema de graves repercussões que a avaliação pode e deve ajudar a
resolver através de:
a)
novas formas de avaliar o que os alunos sabem e são capazes de fazer;
b)
sistemas que permitam avaliar o desempenho de educadores e professores,
apoiando-os no seu desenvolvimento profissional;
c)
processos amplamente participados de autoavaliação das escolas e das
instituições escolares em geral.
Conscientes
das limitações e dos perigos de olharmos para a avaliação de forma pouco crítica,
podemos transformá-la numa importante alavanca de transformação e de melhoria
das realidades educativas. Realmente, a avaliação pode, por exemplo, contribuir
para que se rompa com o paradigma da transmissão do conhecimento e se
desenvolva um paradigma em que o conhecimento é construído interactivamente ou
que o ensino uniforme dê lugar a um ensino diferenciado que responda às
necessidades de todos e de cada um dos jovens estudantes.
Da
mesma maneira, a avaliação pode ser um processo clarificador e de tomada de
consciência coletiva dos professores e das escolas quanto ao desempenho dos
sistemas educativos.
A
avaliação, por definição e natureza, potencializa a valorização e a
credibilidade das competências profissionais, científicas e pedagógicas dos
professores. Neste sentido, poderá ser um importante processo de regulação, de
amadurecimento, de credibilidade e de reconhecimento de uma classe profissional
que, numa diversidade de países, está confrontada com um dos desafios mais
significativos dos últimos anos.
Quaisquer
que sejam os desenvolvimentos das políticas educativas para os próximos anos,
poderá ser grave não atribuir uma prioridade clara à melhoria do ensino, das
aprendizagens e da organização e funcionamento pedagógico das escolas, através
de sistemas de avaliação de natureza marcadamente formativa.
Desta
forma, a partir de uma multiplicidade de perspectivas e de diferentes contextos
de aplicação prática da avaliação, ficam bem claras as suas reais
potencialidades para transformar e melhorar as realidades dos sistemas
educativos contemporâneos.
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