Ficha de Leitura/ Ficha Resumo
Ramos, Conceição C.,REGULAÇÃO DOS
SISTEMAS EDUCATIVOS, O CASO PORTUGUÊS
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“… nous dirons que la structure est centralisée quand tous les
pouvoirs de décision se situent à un seuil point dans l´organisation – à la
limite dans les mains d’un seuil individu, nous dirons que la structure est
décentralisée, lorsque le pouvoir est dispersé entre de nombreuses personnes”
(Mintzberg, 1994:171).
O CASO DO SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS
1.
Contexto cultural nas políticas de administração portuguesa
A cultura
de um estado, persistentemente autocrático e centralizado, que imperou em
Portugal até ao terceiro quartel deste século, deve-se a fatores históricos,
políticos e sociológicos que remontam ao processo de formação do próprio
Estado. Esta afirmação encontra fundamento na tese do historiador José Mattoso
sobre a expressão da identidade nacional. Segundo este autor, Portugal não teve
origem numa formação étnica, mas numa realidade político-administrativa. […]
O Estado
Português foi agregando a si uma série de áreas territoriais com poucos
vínculos entre si, com acentuadas diferenças culturais e com condições de vida
muito distintas. O que fez a sua unidade foi a continuidade de um poder
político que dominou o conjunto de uma maneira firme e fortemente centralizada.
De facto os portugueses nunca foram
propriamente um povo, ou uma etnia, mas súbditos de quem governa.
Lisboa é
a maior aglomeração urbana em Portugal e a concentração das principais atividades
produtivas, administrativas e políticas de todo o país e corresponde ao precoce
e tradicional centralismo do Estado Português. A este fenómeno chamou-se macrocefalia portuguesa, termo
que exprime bem a desproporção entre a concentração de funções económicas e
políticas no centro e o atrofiamento das mesmas funções na periferia (Mattoso,
1998: 56-66).
Para José
Mattoso, este problema não reflete apenas a desigual capacidade de recursos
naturais mas também a desigual distribuição de poderes no território nacional.
[…] Constitui uma realidade estrutural de Portugal Continental.
A
centralização foi a metáfora fundadora do quadro
político administrativo português e a distribuição de poderes, no território,
não teve expressão significativa, nem condições para instituir uma tradição
participativa dos cidadãos nas políticas e na administração pública.
Essa ausência de participação é um dado estrutural que atravessa a
História Portuguesa desde a monarquia ao Estado Novo, evidenciada pelo autor ao
avançar com uma explicação sobre a situação das classes sociais face à Coroa, e
ao concluir que tudo o que realmente tinha verdadeira importância económica ou
social dependia em última instância da Coroa (Mattoso, 1998: 92-93). Na
explicação de Mattoso, (1998: 93) este facto provocava, na prática a formação
de grandes redes clientelares, tanto de funcionários como de vassalos e a
ausência de poderes verdadeiramente concorrentes. Como o meio de conquistar um
lugar ao sol dependia principalmente do favor do soberano e este movia-se mais
pelo critério de fidelidade do que do mérito, o sistema não favorecia nem a
iniciativa privada nem o investimento em atividades produtivas. O fenómeno
perpetua-se até ao passado recente.
Este autor, justifica este comportamento em períodos políticos
posteriores, com o argumento de que as elites intelectuais portuguesas, face à
sua estreiteza e à sua reduzida influência social terem vivido, desde a segunda
metade do século XIX e até depois dos anos 50 deste século, quase sempre
obcecadas pela ideia de decadência, ou pelo que veio a chamar-se o “atraso
económico português”.
Na opinião deste historiador foi preciso esperar, pelo menos 50
anos, para que a inércia de uma economia e de uma sociedade periférica desse
lugar a estruturas mais próximas do modelo europeu. (Matttoso, 1998: 95).
Numa outra
perspectiva de análise, a leitura sincrónica da realidade portuguesa de Sousa Santos (1994) apresenta a tese de que
Portugal é um país em que o Estado desempenha um papel intenso de regulação
social, mas em que existe também uma grande distância entre representantes e
representados o que provoca fenómenos de populismo e clientelismo e mesmo de
privatização de algumas funções estatais.
… um Estado que tenta imitar os padrões de atuação dos Estados e
das políticas mais desenvolvidas, o que se reflete numa legislação
frequentemente muito progressista, sem que os agentes políticos interiorizem
esses padrões nas orientações operacionais e nas práticas de ação política.
… um país em que as codificações jurídicas são frequentemente bem
mais progressistas do que as práticas sociais que continuam retrógradas.
Agostinho da Silva (1988); Villaverde Cabral (1992); Eduardo Lourenço
(1988b, 2000) contribuíram para o conhecimento da identidade sociológica
portuguesa. O objetivo tem como finalidade articular estas duas notas marcantes
da realidade cultural portuguesa para equacionar o problema do contexto cultural,
tomando como parâmetros de referência: a
tendência pesada de centralização que advém dum contexto histórico e a
leitura sociológica do papel e do comportamento do Estado na regulação social.
A descentralização, por sua
vez, é regeneradora desse fenómeno e um dos pilares do regime democrático que
define um outro paradigma sociopolítico. Representa, para o poder político, uma
exigência indispensável ao desenvolvimento económico, social e cultural do
país, à correção das desigualdades pessoais, sectoriais e geográficas da
sociedade portuguesa. Corresponde à convicção de que só se consegue desenvolver
politicamente o país, se se distribuir responsabilidades em toda a sociedade,
combater o gigantismo e a paralisia do estado,
aproximar os serviços das populações, evitar a burocracia, assegurar em maior
grau a participação dos cidadãos na gestão da administração pública.
A descentralização contribui para o desenvolvimento auto
sustentado e a distribuição generalizada de bens porque as formas que toma um
processo de desenvolvimento terão que assentar na realidade concreta da terra e
das pessoas que nela participam. Trata-se de valorizar o todo pela participação
dos elementos integrantes desse todo.
Este novo paradigma sociopolítico que a descentralização induz,
exige a materialidade de instituições e introduz um novo conceito de governabilidade.
Dá-se um movimento de um sistema mais formal e centralizado para
um sistema mais permeável, no sentido em que o governo central já não é supremo
e o sistema político é crescentemente diferenciado e, em vez de uma autoridade
soberana simples há uma multiplicidade de atores para cada área de governação
(Maden, 2000).
Por governabilidade entendemos o conteúdo semântico do termo
governance ou government. Segundo Maden (2000), isto acontece, porque se está a
identificar um movimento na forma como os governos se estão a organizar.
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