CAPÍTULO 2
MODELOS DE
ORGANIZAÇÃO DOS SISTEMAS EDUCATIVOS
Origens sociais
dos sistemas educativos
Os sistemas
educativos, na forma como os conhecemos hoje, surgiram no século XIX, como
resultado direto da luta política entre distintos grupos sociais pelo controlo
social (Archer, 1984).
Com a Revolução
Francesa a burguesia triunfante, aliada aos intelectuais e às massas
trabalhadoras, assumiu o poder político e proclamou novos valores sociais:
Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Mas não possuía poder económico!
Essa fragilidade
económica e financeira da burguesia triunfante, só podia ser compensada pela
fixação de altos impostos, o que seria mal interpretado pelas massas
trabalhadoras que a ajudaram a derrubar a monarquia e assumir o controlo
político da sociedade. A solução encontrada foi mudar a forma de governo,
tornando-o mais forte. O apoio popular foi substituído pela coerção militar
como garantia da estabilidade política. Com um governo imperial forte, chegou a
educação estatal, fortemente centralizada nas leis imperiais.
Em Inglaterra
onde o capitalismo nascente florescia, imperava a teoria segundo a qual uma
aliança com os trabalhadores podia desestabilizar seriamente a sociedade
(Jones, 1977), a aliança entre a classe média, os comerciantes, os industriais
e grupos dissidentes do Clero permitiu desenvolver uma rede de escolas
alternativa ao sistema educacional estabelecido e mantido pela Igreja Anglicana
e ligada à Aristocracia e à elite política governamental. Nestas
circunstâncias, o conflito na Inglaterra não resultou na transferência do poder
para os grupos que se opunham à Igreja. O poder estabelecido foi desafiado e
ameaçado, mas não foi eliminado.
Se no caso
francês, a luta política pelo poder foi ganha pela burguesia e conduziu ao
surgimento de um sistema educativo centralizado, no caso inglês, a aliança
entre a classe média, os comerciantes, os industriais e os dissidentes do clero
não foi suficiente para derrubar a aliança entre o clero, a aristocracia e a
classe política governamental. Como consequência, emergiu um sistema educativo
descentralizado.
Teorias que
explicam o surgimento dos sistemas educativos, entre elas, a teoria
funcionalista, a teoria do controlo social e a teoria da competição.
A teoria
funcionalista considera que à medida que a sociedade foi-se tornando mais
complexa e a divisão do trabalho se intensificou surgiu a necessidade de dar
resposta a dois problemas: i) encontrar uma nova base de interação social (os
indivíduos haviam sido deslocados das suas formas tradicionais de identidade e
de solidariedade social); e ii) encontrar uma nova forma de preparação dos
indivíduos (a especialização das ocupações e a complexidade da sociedade
impossibilitaram a família de continuar a desempenhar o seu papel tradicional
de socialização e colocou a necessidade de uma formação mais especializada das
crianças para assumirem responsabilidades futuras).
A teoria do
controlo social considera que a emergência de uma classe de proletários livres
do controlo do patronato e a sua tendência para a instabilidade, a desordem e o
conflito, levou a que a elite dominante encontrasse na escola uma forma de
controlo desta classe de “gente sem regras”. A escola compensaria, então, a
desintegração da família, através da implantação da lealdade, da obediência e
da bondade e passaria a fazer parte do processo através do qual “a sociedade
começava a regular a vida social dos indivíduos a partir das classes mais
baixas” (Sandin, 1986, p. 255).
A teoria da
competição entre grupos sociais considera a escola como uma instituição que
confere estatuto e não como um meio de socialização. A educação é um recurso de
valor. Dá-se mais valor a quem mais estudou e menos a uma pessoa menos educada.
Com o surgimento das estruturas complexas de ocupação o emprego passou a depender
muito das credenciais educacionais. (Collins, 1971, 1977). A fonte das
credenciais é a escola e o que interessa não é tanto quão competente é a
pessoa, mas que credenciais ela apresenta para sustentar a sua competência. A
educação é, um meio para atingir estatuto social e a motivação por detrás da
escolarização é a competição entre grupos de vários estatutos para aumentar o
nível de escolaridade dos seus filhos. O resultado é a expansão da educação.
A teoria que
considera a educação como um meio de modernização é uma versão atualizada da
teoria funcionalista. Considera que a educação de massas surgiu, porque as
formas modernas de organização social exigem qualidades e habilidades
diferentes daquelas que a família pode transmitir. A escola foi estabelecida
para modernizar as pessoas (Anderson, 1966; Inkeles & Smith, 1974). Outra
variante desta teoria considera que a educação é um instrumento de
transformação da sociedade, para perseguir objetivos coletivos que afetam todos
os seus segmentos. Aqui a educação é vista como um empreendimento societal, que
envolve os indivíduos num projeto coletivo de sociedade. A educação é o
processo que caracteriza a política nacional como um todo, não apenas partes
componentes da política.
Para Boli
(1989), estas teorias são insuficientes na sua tentativa de explicar o
surgimento dos sistemas educativos pois, em todos os casos, a escola é vista
como um meio racional para alcançar objetivos racionais, sejam eles societais
(na teoria funcionalista) ou de um grupo dominante (na teoria do controlo
social). Estas teorias não são consistentes com a forma como a escola realmente
funciona. A escola é uma organização frouxamente articulada (Weick, 1979) onde
os objetivos, sejam eles quais forem, estão apenas parcialmente refletidos no que
acontece no dia-a-dia da escola.
Portanto, do
ponto de vista prático, é difícil utilizar a escola para alcançar objetivos tão
explícitos.
Para Boli
(1989), a educação de massas é um desenvolvimento essencialmente ideológico. O
estabelecimento de uma nova conceção da natureza e do significado da sociedade
produziu uma crença generalizada na necessidade da educação de massas e esta
crença conduziu rapidamente à construção de uma educação de massas virtualmente
universal. A educação de massas resultou de mudanças institucionais de longo
termo que se completaram largamente no século XIX.
Independentemente
da forma como explicam o surgimento dos sistemas educativos, todas as teorias
situam o seu aparecimento no século XIX e relacionam a sua emergência com o surgimento
e florescimento do capitalismo.
Portugal herda a
tradição napoleónica francesa de sistema educativo centralizado.
Modelos de organização dos Sistemas Educativos
A centralização
e a descentralização relacionam-nos com a forma como o poder está distribuído
na organização (Mintzberg, 1995; Donnelly, 2000), ao poder sobre as decisões
tomadas ou ainda à localização da autoridade para tomar decisões (Mintzberg,
1995; Bilhim, 1996; Donnelly, 2000).
Mintzberg (1995)
considera que uma organização é centralizada “quando todos os poderes de
decisão se situam num único ponto da organização – em última instância nas mãos
de um único indivíduo” (Mintzberg, 1995, p. 209).
B. Hage (1980)
define a centralização como “o nível e a variedade da participação dos grupos
nas decisões estratégicas em relação ao número de grupos na organização” (Hage,
1980, p.66). Quanto maior for o número de pessoas que participam no processo de
tomada de decisões estratégicas da organização, menor será a centralização e
maior a descentralização.
Van de Ven e
Ferry (1980), a centralização é o “locus de decisão que determina a autoridade
dentro de uma organização. Quando a maioria das decisões é tomada
hierarquicamente, uma unidade organizacional é considerada centralizada” (Van
de Ven & Ferry, 1980, p. 399).
Sistemas Educativos Centralizados
Estamos perante
um sistema educativo centralizado quando o poder para tomar as decisões mais
importantes em matéria de educação está nas mãos dos serviços centrais do
Ministério da Educação, cabendo aos restantes níveis da hierarquia a sua
aplicação em conformidade com as orientações de funcionamento definidas por
esses serviços. A ideia é assegurar uma certa uniformidade de funcionamento do
sistema. No topo concebe-se, na base executa-se.
Tipos de centralização
Formosinho
(1086) considera que a administração centralizada pode ser concentrada ou
desconcentrada: i) ela é concentrada quando o superior hierárquico dos serviços
centrais é o único competente para tomar decisões, limitando-se os atores dos
escalões inferiores a informar e a executar. No caso concreto do currículo, as
estruturas de coordenação intermédias dos Ministérios da Educação limitam-se a
informar as escolas que, por sua vez, limitam-se a implementar o currículo e
outras circulares do Ministério da Educação sobre diferentes matérias; e ii)
desconcentrada, quando há graus intermédios e inferiores, chefes com
competências para decidir imediatamente, embora sujeitos à direção e inspeção
dos superiores, que podem modificar as decisões por eles tomadas.
A desconcentração
A
desconcentração consiste em estender o poder central sem o transferir para
outras instâncias, criando estruturas intermédias que aplicam as orientações.
Segundo
Formosinho (1986), a desconcentração pode tomar várias formas: i) originária,
quando é a lei que atribui competências aos chefes subalternos para tomarem
decisões; ii) por delegação de competências, quando é o superior hierárquico
quem delega certas competências no inferior, delegação essa que pode cessar a
todo tempo; iii) fragmentada, se, em cada nível intermédio (Província ou
Região), os diferentes departamentos centrais tiverem uma delegação que
comunica diretamente com eles; e iv) coordenada, quando existe, a nível local,
um serviço que coordena e dirige as diferentes delegações. Em Portugal há uma
desconcentração fragmentada.
Em todos os
casos de desconcentração, a responsabilidade final incumbe aos serviços
centrais dos Ministérios da Educação. Afinal o sistema ainda é centralizado!
Razão
para a desconcentração
Existem razões
que podem dar lugar a desconcentração em geral e da educação em especial,
nomeadamente:
- A adequação da
organização: a execução das normas centrais por quem está mais próximo dos
problemas é mais rápida; o ritmo e o tipo de implementação das normas centrais
podem ser adaptados ao contexto local; as decisões de implementação são tomadas
por quem conhece os problemas por estar mais próximo deles.
- A incapacidade
dos serviços centrais de preverem com exatidão certos problemas que surgirão ao
nível local: quando os problemas são previsíveis, os serviços centrais podem
pré decidi-los de modo a que os chefes locais sejam meros executantes. Mas
quando eles se tornam complexos e imprevisíveis, vale a pena desconcentrar,
porque os serviços centrais são incapazes de prever em pormenor, os problemas
que vão surgir, condição prévia para poderem pré decidi-los em normas
burocráticas rígidas.
- A
impossibilidade de os serviços centrais assegurarem o volume de trabalho de
todos os serviços locais.
-O reforço do poder central: uma rede
desconcentrada multiplica a presença do poder central em todos os locais
mantendo-se a cadeia hierárquica de comando e propiciando-se o controlo
indireto.
Seja qual for a
razão, a desconcentração é sempre um processo mitigado de centralização, que
visa aumentar a eficiência da atividade da administração pública, dentro do
modelo burocrático.
A centralização
tem as suas vantagens e inconvenientes. Parecem constituírem vantagens da
centralização o facto de: i) as decisões serem tomadas por administradores que
possuem uma visão global da organização; ii) as decisões serem mais congruentes
com os objetivos organizacionais globais; iii) eliminar os esforços duplicados
e reduzir os custos operacionais de uma eventual descentralização; e iv) algumas
funções promoverem uma maior especialização e aumentarem a habilidade dos
funcionários.
Os
inconvenientes que lhe são apontados referem que: i) os decisores estão distanciados
dos factos sobre os quais decidem; ii) os decisores não têm contacto com as pessoas
e os contextos em que os factos ocorrem; iii) os responsáveis das linhas
hierárquicas inferiores estão distanciados dos objetivos globais da
organização; iv) as linhas de comunicação mais distanciadas provocam demoras e
aumentam os custos operacionais; v) o envolvimento de muitas pessoas aumenta a
possibilidade de distorções e de erros pessoais no processo.
A centralização
é um forte mecanismo de coordenação das decisões dentro das organizações
(Mintzberg, 1995). Ela permite a quem toma a decisão manter uma visão de conjunto
do todo organizacional. Porém, nem todas as decisões podem ser tomadas num único
centro de decisão, dentro de uma só cabeça, nem é sempre possível levar toda a
informação necessária a esse centro, como nos mostram os seus inconvenientes. A
informação pode ser muito fluída e ser muito difícil de ser apreendida e
transmitida.
Mesmo que fosse
possível transmitir toda a informação o seu processamento esbarraria com a
natural falta de capacidade cognitiva que impediria a sua compreensão.
Este
comportamento conduz à saturação informativa: quanto mais informação o cérebro
tenta receber, menos informação recebe na realidade (Driver & Strenfert,
1969).
Isto sugere a
ideia de que quem tem o poder para tomar decisões não tem, forçosamente, a
informação e a capacidade necessárias para tal. Pelo que, parece sensato
considerar uma forma descentralizada de organização do sistema educativo, que
atribui poder a quem tem o saber.
Sistemas Educativos Descentralizados
A
descentralização é substancialmente diferente da desconcentração. Esta conduz a
uma delegação de poderes a pessoas hierarquicamente dependentes, o que, em
última instância, implica o «dever de obediência a ordens, a subordinação ao
poder disciplinar, a possibilidade de revogação, modificação ou reforma do ato
do inferior pelo superior, a possibilidade de um genuíno recurso contra os atos
do subalterno» (Gournay, 1978,p.157).
A
descentralização é uma «devolução de poderes». O Estado deixa de exercer um poder
hierárquico para passar a exercer um poder de tutela. O seu objetivo é
transferir o poder de decisão dos indivíduos que estão num lugar ou num
determinado nível para outros que operam noutro(s) nível(eis) (McGuin &
Welsh, 1999).
Segundo Gournay
(1978), a descentralização transfere o exercício de certas competências
tradicionalmente assumidas pela administração central «a agentes que dependem
não do governo, mas de órgãos que tiram a sua autoridade do facto de
representarem uma parte da população» (Gournay, 1978, p. 157). (Chiavenato,
1993) considera que essa transferência depende de vários fatores, dentre os
quais, i) o tamanho da organização; ii) o ramo de atividade da organização;
iii) as tendências económicas e políticas do país; iv) a filosofia da
administração central e as personalidades nela envolvidas; v) as competências
dos subordinados e a confiança dos superiores nessas competências; e vi) a
facilidade de informações que permitem tomar decisões. Por isso, a
descentralização, em si mesma, não é boa nem é má. É a conjugação desses
fatores que determinará o grau de centralização ou de descentralização mais
adequado para uma organização.
A
descentralização deveria representar a última fase do processo de
desenvolvimento de uma organização em que os seus membros são, efetivamente,
chamados a participar no processo de tomada das decisões cuja execução produz
resultados que afetam substancialmente as suas vidas.
Razões para a descentralização
Para Formosinho
(1986), existem duas ordens de razões para descentralizar o sistema educativo:
razões de ordem política e razões de ordem técnica.
Do ponto de
vista político, a descentralização é o culminar de um processo de
democratização em que a opinião pública manifesta cada vez mais a sua vontade
de ser consultada associada à elaboração das decisões que a afetam diretamente.
Segundo Oliveira
(1980), “A descentralização é concebida como um instrumento destinado a fazer
vingar e atuar a própria democracia, entendida no sentido do direito à
participação dos interessados na função administrativa” (Oliveira, 1980, p.
183). É que numa democracia centralizada há uma visão redutora da participação
dos cidadãos no sentido em que as pessoas são chamadas apenas para votar de
tantos em tantos anos, para determinar que aparelho partidário, cuja formação
não controlam, deve ocupar o aparelho do Estado e implementar políticas em cuja
elaboração não participam. Nesse sentido, a descentralização dá um sentido mais
substancial à participação dos cidadãos na democracia. Contribui para uma
definição clara e precisa das responsabilidades.
Do ponto de
vista técnico, a descentralização refere-se à necessidade de aumentar a
eficácia dos métodos de direção e gestão perante o peso e a lentidão da
burocracia do Estado, à sua incapacidade em gerir. A descentralização permite
uma identificação mais rápida e facilita a procura das soluções mais adequadas
às necessidades locais, por serem tomadas por pessoas que melhor as conhecem e
estarem sintonizadas com a vontade das populações. Mas também, por não terem
que atravessar os canais burocráticos do Estado, pela aproximação dos órgãos
decisores do local onde os problemas surgem e pelo carácter definitivamente
executório das decisões – não são sujeitas à ratificação dos órgãos superiores,
desde que estejam em conformidade com a lei. Isto não acontece com a
desconcentração, em que as decisões tomadas podem ser modificadas pelos órgãos
superiores da hierarquia.
As razões
evocadas para descentralizar a organização dos sistemas educativos superam
alguns dos inconvenientes dos sistemas educativos centralizados e sugere que um
processo de descentralização deve ser criterioso.
Critérios de
descentralização
Ginn e Welsh
(1999) apresentam três critérios de descentralização dos sistemas educativos:
- a legitimidade
democrática (critério de ordem política),
- o
profissionalismo (critério de ordem técnica);
- a eficácia do
mercado (critério de ordem económica).
De acordo com o
critério da legitimidade democrática, parece legítimo que a gestão da educação
seja confiada aos representantes políticos democraticamente eleitos em função
das expectativas dos diferentes grupos sociais. Sendo o processo de eleição
geralmente conflituoso, as pessoas eleitas não precisam de ser,
necessariamente, «experts» nem em educação nem em gestão.
O poder é
inerente à função e não às competências próprias de quem ocupa o lugar. Por
isso, as medidas tomadas por quem exerce esse poder são corretas porque são
tomadas pelos responsáveis e não porque estão em conformidade com os
conhecimentos científicos sobre a matéria. O que sugere, porventura, que as
pessoas que ganham as eleições devem poder conciliar a legitimidade democrática
com a competência técnica.
Segundo o
critério do profissionalismo, o poder para tomar decisões é confiado aos
técnicos habilitados (poder de competência) a quem se pede o que é preciso
fazer para melhor gerir o sistema educativo. As suas competências estão ligadas
ao que é preciso fazer e à maneira de o fazer do que à definição do objetivo a
atingir. O seu poder (de competência) é sempre colocado, em última instância,
sob controlo político, sobretudo nas democracias. Existem, no entanto, casos em
que, uma vez nomeados, gozam de uma autonomia considerável.
Os defensores
deste critério partem do princípio de que a educação é «apolítica» e que deve
ser confiada às mãos de especialistas, às pessoas que tenham adquirido uma
formação e possuam competências e conhecimentos específicos. Neste sentido, as
decisões devem fundamentar-se sobre a pesquisa e a análise das políticas
públicas sendo o essencial da gestão, a adoção de medidas e regulamentos
definidos através da aplicação dos conhecimentos dos especialistas.
Mas a educação
não é nem neutral nem apolítica. Ela é sempre um ato altamente intencional e
subjetivamente carregado. Utiliza recursos, meios e métodos para alcançar um
fim. A sua intencionalidade e a sua subjetividade retiram-lhe qualquer carácter
neutral e apolítico.
O que este
critério parece sugerir é a necessidade de um processo de aprendizagem de um
conjunto de procedimentos e práticas que habilitem os membros das organizações
descentralizadas a tomarem as decisões mais apropriadas e adequadas ao contexto
e realidade em que evoluem.
O critério da
eficácia do mercado distingue a gestão da produção da educação e a gestão do
consumo da educação. A maior parte dos países atribuem ao Estado o monopólio
exclusivo da produção da educação e exigem que todas as crianças sejam educadas
em escolas supervisionadas ou aprovadas pelo Estado. No entanto, numa economia
de mercado, os indivíduos têm toda a liberdade para decidirem sobre o tipo de
educação e escolherem a escola para os seus filhos.
Os adeptos da
ideologia de mercado afirmam que nada confere aos profissionais a capacidade de
satisfazer os desejos e as necessidades daqueles que a educação é chamada a
servir. Não há nada na formação dos educadores, nem na dos economistas que lhes
permita compreender o que o público quer e deseja. Portanto, o mercado é o
melhor meio para explorar a informação sobre o que a clientela quer e o que a
satisfaz. Têm, para nós, maior relevância as causas, o aumento qualitativo e
quantitativo dos sistemas educativos – a sua complexidade – que põe à prova a
capacidade das burocracias centralizadas em manter a qualidade do ensino
ministrado; o aprofundamento da democracia consubstanciada na reivindicação de
uma maior participação dos beneficiários do sistema educativo na definição,
implementação e controlo das políticas educativas; o surgimento das novas tecnologias
de informação e comunicação como elemento importante na construção de sociedades
de conhecimento e informadas constituem.
Vantagens da descentralização
São apontadas
várias vantagens à descentralização:
- Proporciona um
aumento qualitativo da eficiência organizacional, porque permite que as
decisões sejam tomadas pelas unidades situadas nos níveis da hierarquia mais
próximos dos beneficiários, com carácter definitivamente executório (ao
contrário da desconcentração, como vimos mais acima).
- Evita que os
funcionários fujam à responsabilidade recorrendo ao chefe, porque contribui
para uma definição clara e precisa das responsabilidades.
- Permite evitar
a saturação informativa, ou seja, a falta de capacidade de tratamento de um
grande volume de informações quando elas são transmitidas a um único indivíduo.
- Permite
melhorar a qualidade das decisões à medida que o seu volume e complexidade se
reduzem permitindo que os altos funcionários se concentrem nas decisões de
maior importância.
Ela permite uma
redução considerável de papéis nos serviços centrais e os gastos daí
resultantes.
- Facilita o
aumento da velocidade na resposta organizacional às mudanças do meio envolvente
e às exigências dos mercados.
- Permite que
sejam acrescentados mais detalhes à informação que entra no processo de
decisão. Quanto mais a decisão for tomada por quem esteja familiarizado com o
problema, mais provavelmente serão tomados em conta elementos informativos que
se teriam perdido na cadeia de comando.
- Contribui para
a formação de funcionários mais motivados e mais conscientes dos seus resultados
operacionais, permitindo que eles participem do processo da tomada de decisão.
- Constitui uma
boa base de aprendizagem organizacional pois, pela delegação, a gestão de topo
permite que os gestores mais baixos na cadeia hierárquica aprendam a decidir na
prática. Ao decidirem sobre assuntos de pouco impacto organizacional,
preparam-se para assumir responsabilidades mais elevadas à medida que sobem na
cadeia de comando.
O surgimento do sistema educativo centralizado em
Portugal.
Os republicanos
insurgiram-se contra a Monarquia e formou-se uma aliança estratégica entre os
republicanos, os intelectuais e grupos dissidentes da Monarquia que desafiou o
poder da
Monarquia e do
Clero, depôs o rei, tomou o poder político e atacou-se a presença das Ordens
Religiosas no ensino, a doutrinação católica nas escolas do Estado e as praxes
e os privilégios da Universidade de Coimbra e proclamou a República.
Com a
proclamação da República, o sistema educativo passou a ser único, obrigatório,
administrado diretamente pelo governo central, com currículos únicos e
compulsivos.
Barreto (1995)
considera que a tendência centralizadora do sistema educativo visava o alcance
de três objetivos centrais: i) Integrar, no sentido de criar vínculos e laços,
horizontais e verticais, entre todas as unidades e estabelecimentos educativos,
na tentativa de criar um sistema coerente adaptado a uma entidade territorial e
administrativa de âmbito nacional; ii) centralizar ou estabelecer uma
autoridade global, governamental ou estatal, que regule e presida às atividades
de todas as unidades integradas no sistema; e iii) unificar, o mesmo que
homogeneizar métodos e regras, programas e objetivos com vista a propiciar uma
aprendizagem de saberes iguais em toda uma entidade territorial e administrativa,
no Estado-nação, a fim de suscitar comportamentos semelhantes com o propósito
de evitar ou reduzir atuações singulares ou diferentes.
O Sistema
Educativo português é laico e engloba uma série de mecanismos que garantem aos
cidadãos o direito à educação e à igualdade de oportunidades em matéria de
acesso aos centros educativos e de sucesso escolar. Excetuando a gestão
conjunta de alguns centros educativos, cabe ao Ministério da Educação a
responsabilidade pela gestão global, integrada e centralizada do Sistema
Educativo.
As autoridades
centrais asseguram a aplicação da legislação e das normas promulgadas pelo
Governo e pelo Parlamento, desenvolvendo também iniciativas normativas
adicionais através de circulares e diretrizes.
O Ministério da
Educação é o responsável pela definição da política nacional em matéria de
educação, com funções de promover o desenvolvimento e a modernização do sistema
educativo reforçando a conexão entre a educação e a investigação, a ciência, a
tecnologia e a cultura, e preservar e difundir a língua portuguesa para o que,
conta com o apoio de serviços centrais e regionais.
Os serviços
centrais encarregam-se das tarefas de elaboração, desenvolvimento, coordenação,
avaliação e inspeção da educação e da formação, enquanto o ministro é o
responsável pela direção política do Ministério e é assistido, no desempenho
das suas funções por Secretários de Estado.
Os serviços
regionais são constituídos por cinco Direções Regionais de Educação, com
carácter desconcentrado que desenvolvem as tarefas do Ministério da Educação a
nível regional. Essas direcções regionais ocupam-se da orientação, coordenação
e apoio aos centros de ensino não superior, da gestão dos seus recursos humanos,
financeiros e materiais e da assistência tanto aos centros como aos alunos que
os frequentam.
Segundo a Lei de
Bases do Sistema Educativo (Lei nº46/86), o sistema educativo compreende a
educação pré-escolar, a educação escolar e a educação extraescolar.
A educação
escolar compreende os ensinos básico, secundário e superior.
- O ensino
básico é universal obrigatório e gratuito, tem duração de nove anos letivos,
estrutura-se em três ciclos de ensino sequenciais, devendo ingressar neste
ensino todas as crianças residentes no território nacional, que completem os 6
anos de idade até 15 de Setembro (Lei nº 46/86, de 14 de Outubro).
O ensino básico
tem entre outros os seguintes objetivos gerais: “Assegurar uma formação geral
comum a todos os portugueses que lhes garanta a descoberta e o desenvolvimento
dos seus interesses e aptidões, capacidade de raciocínio, memória e espírito
crítico, criatividade, sentido moral e sensibilidade estética, promovendo a
realização individual em harmonia com os valores da solidariedade social;”
“Assegurar que nesta formação sejam equilibradamente interrelacionados o saber
e o saber fazer, a teoria e a prática, a cultura escolar e a cultura do
quotidiano;” - (Alíneas a) e b), do Artigo 7º da Lei n.º 46/86, de 14 de
Outubro).
O ensino básico
divide-se em três ciclos: o 1º ciclo, o 2º ciclo e o 3º ciclo.
- 1º ciclo
compreende quatro anos de escolaridade,
proporciona um ensino globalizante da responsabilidade de um único
professor, auxiliado por outros professores especializados. Tem como objetivos
específicos o enriquecimento da linguagem oral e a iniciação da aprendizagem da
leitura, escrita, aritmética, cálculo e a aquisição de noções básicas do meio
físico e social, expressões plásticas, dramática, musical e motora.
- O 2º ciclo
compreende dois anos de escolaridade, organizados em áreas interdisciplinares
de formação básica da responsabilidade de um professor por área, tendo em vista
habilitar os alunos a assimilar e interpretar crítica e criativamente a
formação humanística, artística, física, desportiva, científica, tecnológica,
moral e cívica, que o currículo nacional proporciona neste nível de ensino.
- O 3º ciclo
compreende três anos de escolaridade, desenvolve o currículo respectivo no
regime de um professor por disciplina ou grupo de disciplinas afins e integra
diversas áreas vocacionais no ano terminal do ciclo.
O ensino
secundário consolida a diversificação e especialização dos percursos educativos
e formativos, oferecendo alternativas de educação e formação, cujo teor
dominante pode ser de formação geral, vocacional, artística ou profissional.
O ensino
pós-secundário organiza-se através da oferta de Cursos de Especialização
Tecnológica (CET), formações pós-secundárias não superiores.
O Ensino
Superior representa o nível mais elevado da oferta de ensino formal, tendo como
condição de acesso a prévia titularidade de um diploma do ensino secundário ou
do pós-secundário e inclui duas vertentes:
- O ensino
universitário;
- O ensino
politécnico.
Em síntese
Com o objetivo
de assegurar que a missão conferida à educação será cumprida, o Estado estende
a sua ação sobre todo o território e torna-se nacional, centralista, chamando a
si a responsabilidade da totalidade dos encargos com todas as tarefas,
incluindo as da educação.
A administração
centralizada do sistema educativo multiplica-se, ou seja, desconcentra-se
garantindo a sua presença no território, através da criação de estruturas e órgãos
com a missão de executar as políticas e as orientações centralmente definidas, a
fim de alcançar as metas traçadas.
Em Portugal, as
autoridades centrais asseguram a aplicação da legislação e das normas
promulgadas pelo Governo e pelo Parlamento. O Ministério da Educação é o responsável
pela definição da política nacional em matéria de educação. Os serviços centrais
encarregam-se das tarefas de elaboração, desenvolvimento, coordenação,
avaliação e inspeção da educação e da formação, enquanto os seus serviços regionais,
com carácter descentralizado, desenvolvem as tarefas do Ministério da Educação
a nível regional. Aqui também, no centro concebe-se e na base executa-se o que
foi concebido. Isto levanta, desde logo, a questão do poder, ou seja, o poder
de conceber as políticas, elaborar os regulamentos situa-se no centro e o dever
de executar as políticas em conformidade com os regulamentos situa-se na base. A
relação entre o centro e as suas estruturas intermédias de coordenação da
educação é uma relação de poder.
Bibliografia: Benedito, Narciso Damásio dos Santos, Centralização de Sistemas Educativos e Autonomia dos Atores
Organizacionais, Processos Coletivos de Interpretação das Orientações
Centrais, Tese de doutoramento em Psicologia, Área de Especialização em
Psicologia do Trabalho e das Organizações, Trabalho efetuado sob a orientação
do Professor Doutor José Bernardo Bicudo de Azeredo Keating, Universidade do Minho, Instituto de
Educação e Psicologia, Novembro
de 2007
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