domingo, 29 de abril de 2012


CAPÍTULO 2
MODELOS DE ORGANIZAÇÃO DOS SISTEMAS EDUCATIVOS

Origens sociais dos sistemas educativos
Os sistemas educativos, na forma como os conhecemos hoje, surgiram no século XIX, como resultado direto da luta política entre distintos grupos sociais pelo controlo social (Archer, 1984).
Com a Revolução Francesa a burguesia triunfante, aliada aos intelectuais e às massas trabalhadoras, assumiu o poder político e proclamou novos valores sociais: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Mas não possuía poder económico!
Essa fragilidade económica e financeira da burguesia triunfante, só podia ser compensada pela fixação de altos impostos, o que seria mal interpretado pelas massas trabalhadoras que a ajudaram a derrubar a monarquia e assumir o controlo político da sociedade. A solução encontrada foi mudar a forma de governo, tornando-o mais forte. O apoio popular foi substituído pela coerção militar como garantia da estabilidade política. Com um governo imperial forte, chegou a educação estatal, fortemente centralizada nas leis imperiais.
Em Inglaterra onde o capitalismo nascente florescia, imperava a teoria segundo a qual uma aliança com os trabalhadores podia desestabilizar seriamente a sociedade (Jones, 1977), a aliança entre a classe média, os comerciantes, os industriais e grupos dissidentes do Clero permitiu desenvolver uma rede de escolas alternativa ao sistema educacional estabelecido e mantido pela Igreja Anglicana e ligada à Aristocracia e à elite política governamental. Nestas circunstâncias, o conflito na Inglaterra não resultou na transferência do poder para os grupos que se opunham à Igreja. O poder estabelecido foi desafiado e ameaçado, mas não foi eliminado.
Se no caso francês, a luta política pelo poder foi ganha pela burguesia e conduziu ao surgimento de um sistema educativo centralizado, no caso inglês, a aliança entre a classe média, os comerciantes, os industriais e os dissidentes do clero não foi suficiente para derrubar a aliança entre o clero, a aristocracia e a classe política governamental. Como consequência, emergiu um sistema educativo descentralizado.
Teorias que explicam o surgimento dos sistemas educativos, entre elas, a teoria funcionalista, a teoria do controlo social e a teoria da competição.
A teoria funcionalista considera que à medida que a sociedade foi-se tornando mais complexa e a divisão do trabalho se intensificou surgiu a necessidade de dar resposta a dois problemas: i) encontrar uma nova base de interação social (os indivíduos haviam sido deslocados das suas formas tradicionais de identidade e de solidariedade social); e ii) encontrar uma nova forma de preparação dos indivíduos (a especialização das ocupações e a complexidade da sociedade impossibilitaram a família de continuar a desempenhar o seu papel tradicional de socialização e colocou a necessidade de uma formação mais especializada das crianças para assumirem responsabilidades futuras).
A teoria do controlo social considera que a emergência de uma classe de proletários livres do controlo do patronato e a sua tendência para a instabilidade, a desordem e o conflito, levou a que a elite dominante encontrasse na escola uma forma de controlo desta classe de “gente sem regras”. A escola compensaria, então, a desintegração da família, através da implantação da lealdade, da obediência e da bondade e passaria a fazer parte do processo através do qual “a sociedade começava a regular a vida social dos indivíduos a partir das classes mais baixas” (Sandin, 1986, p. 255).
A teoria da competição entre grupos sociais considera a escola como uma instituição que confere estatuto e não como um meio de socialização. A educação é um recurso de valor. Dá-se mais valor a quem mais estudou e menos a uma pessoa menos educada. Com o surgimento das estruturas complexas de ocupação o emprego passou a depender muito das credenciais educacionais. (Collins, 1971, 1977). A fonte das credenciais é a escola e o que interessa não é tanto quão competente é a pessoa, mas que credenciais ela apresenta para sustentar a sua competência. A educação é, um meio para atingir estatuto social e a motivação por detrás da escolarização é a competição entre grupos de vários estatutos para aumentar o nível de escolaridade dos seus filhos. O resultado é a expansão da educação.
A teoria que considera a educação como um meio de modernização é uma versão atualizada da teoria funcionalista. Considera que a educação de massas surgiu, porque as formas modernas de organização social exigem qualidades e habilidades diferentes daquelas que a família pode transmitir. A escola foi estabelecida para modernizar as pessoas (Anderson, 1966; Inkeles & Smith, 1974). Outra variante desta teoria considera que a educação é um instrumento de transformação da sociedade, para perseguir objetivos coletivos que afetam todos os seus segmentos. Aqui a educação é vista como um empreendimento societal, que envolve os indivíduos num projeto coletivo de sociedade. A educação é o processo que caracteriza a política nacional como um todo, não apenas partes componentes da política.
Para Boli (1989), estas teorias são insuficientes na sua tentativa de explicar o surgimento dos sistemas educativos pois, em todos os casos, a escola é vista como um meio racional para alcançar objetivos racionais, sejam eles societais (na teoria funcionalista) ou de um grupo dominante (na teoria do controlo social). Estas teorias não são consistentes com a forma como a escola realmente funciona. A escola é uma organização frouxamente articulada (Weick, 1979) onde os objetivos, sejam eles quais forem, estão apenas parcialmente refletidos no que acontece no dia-a-dia da escola.
Portanto, do ponto de vista prático, é difícil utilizar a escola para alcançar objetivos tão explícitos.
Para Boli (1989), a educação de massas é um desenvolvimento essencialmente ideológico. O estabelecimento de uma nova conceção da natureza e do significado da sociedade produziu uma crença generalizada na necessidade da educação de massas e esta crença conduziu rapidamente à construção de uma educação de massas virtualmente universal. A educação de massas resultou de mudanças institucionais de longo termo que se completaram largamente no século XIX.
Independentemente da forma como explicam o surgimento dos sistemas educativos, todas as teorias situam o seu aparecimento no século XIX e relacionam a sua emergência com o surgimento e florescimento do capitalismo.
Portugal herda a tradição napoleónica francesa de sistema educativo centralizado.

Modelos de organização dos Sistemas Educativos
A centralização e a descentralização relacionam-nos com a forma como o poder está distribuído na organização (Mintzberg, 1995; Donnelly, 2000), ao poder sobre as decisões tomadas ou ainda à localização da autoridade para tomar decisões (Mintzberg, 1995; Bilhim, 1996; Donnelly, 2000).
Mintzberg (1995) considera que uma organização é centralizada “quando todos os poderes de decisão se situam num único ponto da organização – em última instância nas mãos de um único indivíduo” (Mintzberg, 1995, p. 209).
B. Hage (1980) define a centralização como “o nível e a variedade da participação dos grupos nas decisões estratégicas em relação ao número de grupos na organização” (Hage, 1980, p.66). Quanto maior for o número de pessoas que participam no processo de tomada de decisões estratégicas da organização, menor será a centralização e maior a descentralização.
Van de Ven e Ferry (1980), a centralização é o “locus de decisão que determina a autoridade dentro de uma organização. Quando a maioria das decisões é tomada hierarquicamente, uma unidade organizacional é considerada centralizada” (Van de Ven & Ferry, 1980, p. 399).

Sistemas Educativos Centralizados
Estamos perante um sistema educativo centralizado quando o poder para tomar as decisões mais importantes em matéria de educação está nas mãos dos serviços centrais do Ministério da Educação, cabendo aos restantes níveis da hierarquia a sua aplicação em conformidade com as orientações de funcionamento definidas por esses serviços. A ideia é assegurar uma certa uniformidade de funcionamento do sistema. No topo concebe-se, na base executa-se.

Tipos de centralização
Formosinho (1086) considera que a administração centralizada pode ser concentrada ou desconcentrada: i) ela é concentrada quando o superior hierárquico dos serviços centrais é o único competente para tomar decisões, limitando-se os atores dos escalões inferiores a informar e a executar. No caso concreto do currículo, as estruturas de coordenação intermédias dos Ministérios da Educação limitam-se a informar as escolas que, por sua vez, limitam-se a implementar o currículo e outras circulares do Ministério da Educação sobre diferentes matérias; e ii) desconcentrada, quando há graus intermédios e inferiores, chefes com competências para decidir imediatamente, embora sujeitos à direção e inspeção dos superiores, que podem modificar as decisões por eles tomadas.

A desconcentração
A desconcentração consiste em estender o poder central sem o transferir para outras instâncias, criando estruturas intermédias que aplicam as orientações.
Segundo Formosinho (1986), a desconcentração pode tomar várias formas: i) originária, quando é a lei que atribui competências aos chefes subalternos para tomarem decisões; ii) por delegação de competências, quando é o superior hierárquico quem delega certas competências no inferior, delegação essa que pode cessar a todo tempo; iii) fragmentada, se, em cada nível intermédio (Província ou Região), os diferentes departamentos centrais tiverem uma delegação que comunica diretamente com eles; e iv) coordenada, quando existe, a nível local, um serviço que coordena e dirige as diferentes delegações. Em Portugal há uma desconcentração fragmentada.
Em todos os casos de desconcentração, a responsabilidade final incumbe aos serviços centrais dos Ministérios da Educação. Afinal o sistema ainda é centralizado!

 Razão para a desconcentração
Existem razões que podem dar lugar a desconcentração em geral e da educação em especial, nomeadamente:
- A adequação da organização: a execução das normas centrais por quem está mais próximo dos problemas é mais rápida; o ritmo e o tipo de implementação das normas centrais podem ser adaptados ao contexto local; as decisões de implementação são tomadas por quem conhece os problemas por estar mais próximo deles.
- A incapacidade dos serviços centrais de preverem com exatidão certos problemas que surgirão ao nível local: quando os problemas são previsíveis, os serviços centrais podem pré decidi-los de modo a que os chefes locais sejam meros executantes. Mas quando eles se tornam complexos e imprevisíveis, vale a pena desconcentrar, porque os serviços centrais são incapazes de prever em pormenor, os problemas que vão surgir, condição prévia para poderem pré decidi-los em normas burocráticas rígidas.
- A impossibilidade de os serviços centrais assegurarem o volume de trabalho de todos os serviços locais.
 -O reforço do poder central: uma rede desconcentrada multiplica a presença do poder central em todos os locais mantendo-se a cadeia hierárquica de comando e propiciando-se o controlo indireto.
Seja qual for a razão, a desconcentração é sempre um processo mitigado de centralização, que visa aumentar a eficiência da atividade da administração pública, dentro do modelo burocrático.
A centralização tem as suas vantagens e inconvenientes. Parecem constituírem vantagens da centralização o facto de: i) as decisões serem tomadas por administradores que possuem uma visão global da organização; ii) as decisões serem mais congruentes com os objetivos organizacionais globais; iii) eliminar os esforços duplicados e reduzir os custos operacionais de uma eventual descentralização; e iv) algumas funções promoverem uma maior especialização e aumentarem a habilidade dos funcionários.
Os inconvenientes que lhe são apontados referem que: i) os decisores estão distanciados dos factos sobre os quais decidem; ii) os decisores não têm contacto com as pessoas e os contextos em que os factos ocorrem; iii) os responsáveis das linhas hierárquicas inferiores estão distanciados dos objetivos globais da organização; iv) as linhas de comunicação mais distanciadas provocam demoras e aumentam os custos operacionais; v) o envolvimento de muitas pessoas aumenta a possibilidade de distorções e de erros pessoais no processo.
A centralização é um forte mecanismo de coordenação das decisões dentro das organizações (Mintzberg, 1995). Ela permite a quem toma a decisão manter uma visão de conjunto do todo organizacional. Porém, nem todas as decisões podem ser tomadas num único centro de decisão, dentro de uma só cabeça, nem é sempre possível levar toda a informação necessária a esse centro, como nos mostram os seus inconvenientes. A informação pode ser muito fluída e ser muito difícil de ser apreendida e transmitida.
Mesmo que fosse possível transmitir toda a informação o seu processamento esbarraria com a natural falta de capacidade cognitiva que impediria a sua compreensão.
Este comportamento conduz à saturação informativa: quanto mais informação o cérebro tenta receber, menos informação recebe na realidade (Driver & Strenfert, 1969).
Isto sugere a ideia de que quem tem o poder para tomar decisões não tem, forçosamente, a informação e a capacidade necessárias para tal. Pelo que, parece sensato considerar uma forma descentralizada de organização do sistema educativo, que atribui poder a quem tem o saber.

Sistemas Educativos Descentralizados
A descentralização é substancialmente diferente da desconcentração. Esta conduz a uma delegação de poderes a pessoas hierarquicamente dependentes, o que, em última instância, implica o «dever de obediência a ordens, a subordinação ao poder disciplinar, a possibilidade de revogação, modificação ou reforma do ato do inferior pelo superior, a possibilidade de um genuíno recurso contra os atos do subalterno» (Gournay, 1978,p.157).
A descentralização é uma «devolução de poderes». O Estado deixa de exercer um poder hierárquico para passar a exercer um poder de tutela. O seu objetivo é transferir o poder de decisão dos indivíduos que estão num lugar ou num determinado nível para outros que operam noutro(s) nível(eis) (McGuin & Welsh, 1999).
Segundo Gournay (1978), a descentralização transfere o exercício de certas competências tradicionalmente assumidas pela administração central «a agentes que dependem não do governo, mas de órgãos que tiram a sua autoridade do facto de representarem uma parte da população» (Gournay, 1978, p. 157). (Chiavenato, 1993) considera que essa transferência depende de vários fatores, dentre os quais, i) o tamanho da organização; ii) o ramo de atividade da organização; iii) as tendências económicas e políticas do país; iv) a filosofia da administração central e as personalidades nela envolvidas; v) as competências dos subordinados e a confiança dos superiores nessas competências; e vi) a facilidade de informações que permitem tomar decisões. Por isso, a descentralização, em si mesma, não é boa nem é má. É a conjugação desses fatores que determinará o grau de centralização ou de descentralização mais adequado para uma organização.
A descentralização deveria representar a última fase do processo de desenvolvimento de uma organização em que os seus membros são, efetivamente, chamados a participar no processo de tomada das decisões cuja execução produz resultados que afetam substancialmente as suas vidas.

Razões para a descentralização
Para Formosinho (1986), existem duas ordens de razões para descentralizar o sistema educativo: razões de ordem política e razões de ordem técnica.
Do ponto de vista político, a descentralização é o culminar de um processo de democratização em que a opinião pública manifesta cada vez mais a sua vontade de ser consultada associada à elaboração das decisões que a afetam diretamente.
Segundo Oliveira (1980), “A descentralização é concebida como um instrumento destinado a fazer vingar e atuar a própria democracia, entendida no sentido do direito à participação dos interessados na função administrativa” (Oliveira, 1980, p. 183). É que numa democracia centralizada há uma visão redutora da participação dos cidadãos no sentido em que as pessoas são chamadas apenas para votar de tantos em tantos anos, para determinar que aparelho partidário, cuja formação não controlam, deve ocupar o aparelho do Estado e implementar políticas em cuja elaboração não participam. Nesse sentido, a descentralização dá um sentido mais substancial à participação dos cidadãos na democracia. Contribui para uma definição clara e precisa das responsabilidades.
Do ponto de vista técnico, a descentralização refere-se à necessidade de aumentar a eficácia dos métodos de direção e gestão perante o peso e a lentidão da burocracia do Estado, à sua incapacidade em gerir. A descentralização permite uma identificação mais rápida e facilita a procura das soluções mais adequadas às necessidades locais, por serem tomadas por pessoas que melhor as conhecem e estarem sintonizadas com a vontade das populações. Mas também, por não terem que atravessar os canais burocráticos do Estado, pela aproximação dos órgãos decisores do local onde os problemas surgem e pelo carácter definitivamente executório das decisões – não são sujeitas à ratificação dos órgãos superiores, desde que estejam em conformidade com a lei. Isto não acontece com a desconcentração, em que as decisões tomadas podem ser modificadas pelos órgãos superiores da hierarquia.
As razões evocadas para descentralizar a organização dos sistemas educativos superam alguns dos inconvenientes dos sistemas educativos centralizados e sugere que um processo de descentralização deve ser criterioso.

 Critérios de descentralização
Ginn e Welsh (1999) apresentam três critérios de descentralização dos sistemas educativos:
- a legitimidade democrática (critério de ordem política),
- o profissionalismo (critério de ordem técnica);
- a eficácia do mercado (critério de ordem económica).
De acordo com o critério da legitimidade democrática, parece legítimo que a gestão da educação seja confiada aos representantes políticos democraticamente eleitos em função das expectativas dos diferentes grupos sociais. Sendo o processo de eleição geralmente conflituoso, as pessoas eleitas não precisam de ser, necessariamente, «experts» nem em educação nem em gestão.
O poder é inerente à função e não às competências próprias de quem ocupa o lugar. Por isso, as medidas tomadas por quem exerce esse poder são corretas porque são tomadas pelos responsáveis e não porque estão em conformidade com os conhecimentos científicos sobre a matéria. O que sugere, porventura, que as pessoas que ganham as eleições devem poder conciliar a legitimidade democrática com a competência técnica.
Segundo o critério do profissionalismo, o poder para tomar decisões é confiado aos técnicos habilitados (poder de competência) a quem se pede o que é preciso fazer para melhor gerir o sistema educativo. As suas competências estão ligadas ao que é preciso fazer e à maneira de o fazer do que à definição do objetivo a atingir. O seu poder (de competência) é sempre colocado, em última instância, sob controlo político, sobretudo nas democracias. Existem, no entanto, casos em que, uma vez nomeados, gozam de uma autonomia considerável.
Os defensores deste critério partem do princípio de que a educação é «apolítica» e que deve ser confiada às mãos de especialistas, às pessoas que tenham adquirido uma formação e possuam competências e conhecimentos específicos. Neste sentido, as decisões devem fundamentar-se sobre a pesquisa e a análise das políticas públicas sendo o essencial da gestão, a adoção de medidas e regulamentos definidos através da aplicação dos conhecimentos dos especialistas.
Mas a educação não é nem neutral nem apolítica. Ela é sempre um ato altamente intencional e subjetivamente carregado. Utiliza recursos, meios e métodos para alcançar um fim. A sua intencionalidade e a sua subjetividade retiram-lhe qualquer carácter neutral e apolítico.
O que este critério parece sugerir é a necessidade de um processo de aprendizagem de um conjunto de procedimentos e práticas que habilitem os membros das organizações descentralizadas a tomarem as decisões mais apropriadas e adequadas ao contexto e realidade em que evoluem.
O critério da eficácia do mercado distingue a gestão da produção da educação e a gestão do consumo da educação. A maior parte dos países atribuem ao Estado o monopólio exclusivo da produção da educação e exigem que todas as crianças sejam educadas em escolas supervisionadas ou aprovadas pelo Estado. No entanto, numa economia de mercado, os indivíduos têm toda a liberdade para decidirem sobre o tipo de educação e escolherem a escola para os seus filhos.
Os adeptos da ideologia de mercado afirmam que nada confere aos profissionais a capacidade de satisfazer os desejos e as necessidades daqueles que a educação é chamada a servir. Não há nada na formação dos educadores, nem na dos economistas que lhes permita compreender o que o público quer e deseja. Portanto, o mercado é o melhor meio para explorar a informação sobre o que a clientela quer e o que a satisfaz. Têm, para nós, maior relevância as causas, o aumento qualitativo e quantitativo dos sistemas educativos – a sua complexidade – que põe à prova a capacidade das burocracias centralizadas em manter a qualidade do ensino ministrado; o aprofundamento da democracia consubstanciada na reivindicação de uma maior participação dos beneficiários do sistema educativo na definição, implementação e controlo das políticas educativas; o surgimento das novas tecnologias de informação e comunicação como elemento importante na construção de sociedades de conhecimento e informadas constituem.

 Vantagens da descentralização
São apontadas várias vantagens à descentralização:
- Proporciona um aumento qualitativo da eficiência organizacional, porque permite que as decisões sejam tomadas pelas unidades situadas nos níveis da hierarquia mais próximos dos beneficiários, com carácter definitivamente executório (ao contrário da desconcentração, como vimos mais acima).
- Evita que os funcionários fujam à responsabilidade recorrendo ao chefe, porque contribui para uma definição clara e precisa das responsabilidades.
- Permite evitar a saturação informativa, ou seja, a falta de capacidade de tratamento de um grande volume de informações quando elas são transmitidas a um único indivíduo.
- Permite melhorar a qualidade das decisões à medida que o seu volume e complexidade se reduzem permitindo que os altos funcionários se concentrem nas decisões de maior importância.
Ela permite uma redução considerável de papéis nos serviços centrais e os gastos daí resultantes.
- Facilita o aumento da velocidade na resposta organizacional às mudanças do meio envolvente e às exigências dos mercados.
- Permite que sejam acrescentados mais detalhes à informação que entra no processo de decisão. Quanto mais a decisão for tomada por quem esteja familiarizado com o problema, mais provavelmente serão tomados em conta elementos informativos que se teriam perdido na cadeia de comando.
- Contribui para a formação de funcionários mais motivados e mais conscientes dos seus resultados operacionais, permitindo que eles participem do processo da tomada de decisão.
- Constitui uma boa base de aprendizagem organizacional pois, pela delegação, a gestão de topo permite que os gestores mais baixos na cadeia hierárquica aprendam a decidir na prática. Ao decidirem sobre assuntos de pouco impacto organizacional, preparam-se para assumir responsabilidades mais elevadas à medida que sobem na cadeia de comando.

O surgimento do sistema educativo centralizado em Portugal.
Os republicanos insurgiram-se contra a Monarquia e formou-se uma aliança estratégica entre os republicanos, os intelectuais e grupos dissidentes da Monarquia que desafiou o poder da
Monarquia e do Clero, depôs o rei, tomou o poder político e atacou-se a presença das Ordens Religiosas no ensino, a doutrinação católica nas escolas do Estado e as praxes e os privilégios da Universidade de Coimbra e proclamou a República.
Com a proclamação da República, o sistema educativo passou a ser único, obrigatório, administrado diretamente pelo governo central, com currículos únicos e compulsivos.
Barreto (1995) considera que a tendência centralizadora do sistema educativo visava o alcance de três objetivos centrais: i) Integrar, no sentido de criar vínculos e laços, horizontais e verticais, entre todas as unidades e estabelecimentos educativos, na tentativa de criar um sistema coerente adaptado a uma entidade territorial e administrativa de âmbito nacional; ii) centralizar ou estabelecer uma autoridade global, governamental ou estatal, que regule e presida às atividades de todas as unidades integradas no sistema; e iii) unificar, o mesmo que homogeneizar métodos e regras, programas e objetivos com vista a propiciar uma aprendizagem de saberes iguais em toda uma entidade territorial e administrativa, no Estado-nação, a fim de suscitar comportamentos semelhantes com o propósito de evitar ou reduzir atuações singulares ou diferentes.
O Sistema Educativo português é laico e engloba uma série de mecanismos que garantem aos cidadãos o direito à educação e à igualdade de oportunidades em matéria de acesso aos centros educativos e de sucesso escolar. Excetuando a gestão conjunta de alguns centros educativos, cabe ao Ministério da Educação a responsabilidade pela gestão global, integrada e centralizada do Sistema Educativo.
As autoridades centrais asseguram a aplicação da legislação e das normas promulgadas pelo Governo e pelo Parlamento, desenvolvendo também iniciativas normativas adicionais através de circulares e diretrizes.
O Ministério da Educação é o responsável pela definição da política nacional em matéria de educação, com funções de promover o desenvolvimento e a modernização do sistema educativo reforçando a conexão entre a educação e a investigação, a ciência, a tecnologia e a cultura, e preservar e difundir a língua portuguesa para o que, conta com o apoio de serviços centrais e regionais.
Os serviços centrais encarregam-se das tarefas de elaboração, desenvolvimento, coordenação, avaliação e inspeção da educação e da formação, enquanto o ministro é o responsável pela direção política do Ministério e é assistido, no desempenho das suas funções por Secretários de Estado.
Os serviços regionais são constituídos por cinco Direções Regionais de Educação, com carácter desconcentrado que desenvolvem as tarefas do Ministério da Educação a nível regional. Essas direcções regionais ocupam-se da orientação, coordenação e apoio aos centros de ensino não superior, da gestão dos seus recursos humanos, financeiros e materiais e da assistência tanto aos centros como aos alunos que os frequentam.
Segundo a Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº46/86), o sistema educativo compreende a educação pré-escolar, a educação escolar e a educação extraescolar.
A educação escolar compreende os ensinos básico, secundário e superior.
- O ensino básico é universal obrigatório e gratuito, tem duração de nove anos letivos, estrutura-se em três ciclos de ensino sequenciais, devendo ingressar neste ensino todas as crianças residentes no território nacional, que completem os 6 anos de idade até 15 de Setembro (Lei nº 46/86, de 14 de Outubro).
O ensino básico tem entre outros os seguintes objetivos gerais: “Assegurar uma formação geral comum a todos os portugueses que lhes garanta a descoberta e o desenvolvimento dos seus interesses e aptidões, capacidade de raciocínio, memória e espírito crítico, criatividade, sentido moral e sensibilidade estética, promovendo a realização individual em harmonia com os valores da solidariedade social;” “Assegurar que nesta formação sejam equilibradamente interrelacionados o saber e o saber fazer, a teoria e a prática, a cultura escolar e a cultura do quotidiano;” - (Alíneas a) e b), do Artigo 7º da Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro).
O ensino básico divide-se em três ciclos: o 1º ciclo, o 2º ciclo e o 3º ciclo.
- 1º ciclo compreende quatro anos de escolaridade,  proporciona um ensino globalizante da responsabilidade de um único professor, auxiliado por outros professores especializados. Tem como objetivos específicos o enriquecimento da linguagem oral e a iniciação da aprendizagem da leitura, escrita, aritmética, cálculo e a aquisição de noções básicas do meio físico e social, expressões plásticas, dramática, musical e motora.
- O 2º ciclo compreende dois anos de escolaridade, organizados em áreas interdisciplinares de formação básica da responsabilidade de um professor por área, tendo em vista habilitar os alunos a assimilar e interpretar crítica e criativamente a formação humanística, artística, física, desportiva, científica, tecnológica, moral e cívica, que o currículo nacional proporciona neste nível de ensino.
- O 3º ciclo compreende três anos de escolaridade, desenvolve o currículo respectivo no regime de um professor por disciplina ou grupo de disciplinas afins e integra diversas áreas vocacionais no ano terminal do ciclo.
O ensino secundário consolida a diversificação e especialização dos percursos educativos e formativos, oferecendo alternativas de educação e formação, cujo teor dominante pode ser de formação geral, vocacional, artística ou profissional.
O ensino pós-secundário organiza-se através da oferta de Cursos de Especialização Tecnológica (CET), formações pós-secundárias não superiores.
O Ensino Superior representa o nível mais elevado da oferta de ensino formal, tendo como condição de acesso a prévia titularidade de um diploma do ensino secundário ou do pós-secundário e inclui duas vertentes:
- O ensino universitário;
- O ensino politécnico.

Em síntese

Com o objetivo de assegurar que a missão conferida à educação será cumprida, o Estado estende a sua ação sobre todo o território e torna-se nacional, centralista, chamando a si a responsabilidade da totalidade dos encargos com todas as tarefas, incluindo as da educação.
A administração centralizada do sistema educativo multiplica-se, ou seja, desconcentra-se garantindo a sua presença no território, através da criação de estruturas e órgãos com a missão de executar as políticas e as orientações centralmente definidas, a fim de alcançar as metas traçadas.
Em Portugal, as autoridades centrais asseguram a aplicação da legislação e das normas promulgadas pelo Governo e pelo Parlamento. O Ministério da Educação é o responsável pela definição da política nacional em matéria de educação. Os serviços centrais encarregam-se das tarefas de elaboração, desenvolvimento, coordenação, avaliação e inspeção da educação e da formação, enquanto os seus serviços regionais, com carácter descentralizado, desenvolvem as tarefas do Ministério da Educação a nível regional. Aqui também, no centro concebe-se e na base executa-se o que foi concebido. Isto levanta, desde logo, a questão do poder, ou seja, o poder de conceber as políticas, elaborar os regulamentos situa-se no centro e o dever de executar as políticas em conformidade com os regulamentos situa-se na base. A relação entre o centro e as suas estruturas intermédias de coordenação da educação é uma relação de poder.


Bibliografia: Benedito, Narciso Damásio dos Santos, Centralização de Sistemas Educativos e Autonomia dos Atores Organizacionais, Processos Coletivos de Interpretação das Orientações Centrais, Tese de doutoramento em Psicologia, Área de Especialização em Psicologia do Trabalho e das Organizações, Trabalho efetuado sob a orientação do Professor Doutor José Bernardo Bicudo de Azeredo Keating, Universidade do Minho, Instituto de Educação e Psicologia, Novembro de 2007


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